José Raul Teixeira
Qual deve ser a atitude dos
dirigentes espíritas relativamente a essa enxurrada de obras mediúnicas de origem duvidosa,
que tem infestado o mercado de publicações espíritas nos últimos tempos? Será que Allan Kardec, no
seu tempo, ficaria calado diante dessas obras?
Acredito que num período em que o planeta
está vivendo tormentos de todos os tipos, confirmando o que considera Allan Kardec, em seu
livro A Gênese, ao afirmar que, hoje, não são mais as entranhas do planeta que se agitam:
são as da Humanidade, não poderia o nosso Movimento Espírita estar livre dessa avalanche
atormentadora de más influências, seja de indivíduos aventureiros e insanos
─ que
anseiam por vitórias passageiras e/ou lucrativas, sem a necessária consciência do tipo de
semente que estão plantando para colheita complexa no porvir ─ seja de
entidades desencarnadas que continuam zombando dos esforços da Luz, das Falanges Crísticas,
que visam desfazer as sombras que se demoram sobre a Terra.
Na medida em que os dirigentes espíritas
vão se tornando mais lúcidos e, por conseguinte, mais coerentes com os princípios do
Espiritismo, conseguem dar-se conta de que qualquer obra que divulguemos em nome da nossa
Doutrina deve ter a chancela do bom senso kardequiano. Compreenderão que não vale oferecer
ao grande público tudo o que vai surgindo no mercado livresco porque tenha o título de obra
mediúnica ou espírita, a fim de obter o tão esperado “lucro”. Primeiro, porque nem tudo o
que é mediúnico tem que ser espírita, já que a mediunidade não é patrimônio do Espiritismo.
Segundo, porque o critério utilizado pelo Codificador do Espiritismo para a seleção e
publicação de textos é bastante rigoroso, indiscutivelmente responsável. Sempre que alguém
se põe a publicar e a comercializar produtos sem qualidade genuinamente espírita, no mínimo
comete o erro de lesa-verdade espírita, o que ao longo do tempo deve acarretar muitas coisas
graves nas mentes dos que as leem sem os necessários filtros do conhecimento dos livros de
Kardec.
Com relação a Allan Kardec, estou certo de
que não aceitaria tal fato com a passividade que temos encontrado no nosso Movimento, uma
vez que são muitos os dirigentes, nos mais variados níveis de responsabilidades, que não têm
coragem de afrontar o status quo vigente nesse campo literário, seja para não terem
aborrecimentos e se pouparem das investidas retaliadoras dos interessados na manutenção do
que acontece agora, seja porque também não dispõem do necessário senso crítico para ver os
elementos antiespíritas ou inverídicos que tais obras contêm.
É na Revista Espírita, publicada por
Kardec no mês de maio de 1863, quando ele faz um exame das comunicações mediúnicas que lhe
eram enviadas, que encontramos suas palavras dizendo: Em grande número encontramo-las
notoriamente más, no fundo e na forma, evidente produto de Espíritos ignorantes, obsessores
ou mistificadores e que juram pelos nomes mais ou menos pomposos que as assinam. Publicá-las
teria sido dar armas à crítica. Vemos, assim, que o Codificador do Espiritismo tomava
posição e se pronunciava a respeito com a firmeza que o caracterizava.
Temos lido livros ditos mediúnicos onde
são apresentados o chulo da pornografia, das descrições libidinosas, fantasiosas descrições
que não suportam o crivo da razão espírita, ao lado de outras coisas sem nexo, sem sentido
para o processo de renovação e crescimento da criatura humana, sob a ótica do Consolador.
Vejamos o que escreve Kardec no texto supracitado: Para começar convém delas afastar (das
massas) tudo quanto, sendo de interesse privado, só interessa àquele que lhe concerne.
Depois, tudo quanto é vulgar no estilo e nas ideias, ou pueril pelo assunto. Uma coisa pode
ser excelente em si mesma, muito boa para servir de instrução pessoal; mas o que deve ser
entregue ao público exige condições especiais. Infelizmente o homem é inclinado a supor que
tudo o que lhe agrada deve agradar aos outros. O mais hábil pode enganar-se; tudo está em
enganar-se o menos possível. Há Espíritos que se comprazem em alimentar a ilusão em certos
médiuns. Por isso nunca seria demais recomendar a estes não confiar em seu próprio
julgamento. É nisso que os grupos são úteis: pela multiplicidade de opiniões que podem ser
colhidas. Aquele que, neste caso, recusasse a opinião da maioria, julgando-se mais
esclarecido que todos, provaria superabundantemente a má influência sob a qual se acha.
Vale a pena continuar a ler o que nos diz
o Codificador, Allan Kardec sobre o tema em apreço: Aplicando estes princípios de ecletismo
às comunicações que nos enviaram, diremos que em 3.600 há mais de 3.000 que são de uma
moralidade irreprochável, e excelentes como fundo; mas que desse número não há mais de 300
para publicidade, e apenas cem de um mérito inconteste. Essas comunicações vieram de muitos
pontos diferentes. Inferimos que a proporção deve ser mais ou menos geral. Por aí pode
julgar-se da necessidade de não publicar inconsideradamente tudo quanto vem dos Espíritos,
se se quiser atingir o objetivo a que nos propomos, tanto do ponto de vista material quanto
do efeito moral e da opinião que os indiferentes possam fazer do Espiritismo.
Bem entendemos, pois, que Kardec não se
acomodaria silenciosamente, como não se acomodou em sua época. Hoje em dia nos deparamos com
um espírito acomodatício em nosso Movimento, o que se mostra indicativo do descompromisso de
muitos com a grandeza e clareza do Espiritismo, nada obstante continuem ocupando as mais
diversas posições nos seus campos de atividades.
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